Sensação de desamparo, fracasso, tristeza, melancolia e desânimo. Ansiedade, aceleração e hiperatividade.
Tantos apelos, emoções fortes, dores insuportáveis.
Por que hoje, na cultura da felicidade e do sucesso, as pessoas estão desistindo de viver? O que isso significa?
Agora, deparamo-nos com crianças, adolescentes e adultos jovens que lidam com suas dores existenciais querendo pôr fim a própria vida.
Como reconhecer quem talvez precise de ajuda mas permanece quieto e calado?
Um assunto complexo não merece explicações simples,
A ideia não é patologizar, rotular o sujeito com um diagnóstico de transtorno mental.
Trata-se de acolher, cuidar e escutar ditos e não ditos que atravessam este fenômeno psíquico, social e cultural.
Para tanto, é preciso diferenciar tristeza e depressão maior ou melancolia.
A depressão maior ou a melancolia não podem ser reduzidas a tristeza ordinária. Trata-se de dois quadros diferentes.
A tristeza cede aos momentos bons.
Na tristeza vemos intervalos de felicidade.

A depressão maior e a melancolia não cedem aos momentos agradáveis. Há uma ampliação do negativo.
Uma lente “preto e branco” que não faz freio ao empuxo da morte.
Quem tem ideação ou já vivenciou tentativa de suicídio, tem uma percepção do mundo pelas “lentes” da falta de pertencimento e desvinculação.
Não há laço com as coisas do mundo, incluindo pessoas, atividades, projetos, etc.
É justamente a falta de “liga” com as coisas, incluindo o “si mesmo”, e a ausência de tentativa de insistir em dar sentido a vida que fazem a pessoa enveredar pelo caminho do suicídio.
Se houvesse um sentido mínimo na e da existência, a tentativa não seria posta em ato.
As pessoas se sentem anestesiadas. Uma ausência radical de conexão. Elas não conseguem amar, ou seja, investir em algo.
Aliás, usar estes artifícios para mostrar o “bom da vida” podem aumentar a culpa e a auto recriminação, afinal, não conseguir amar uma mãe adorável, por exemplo, é algo moralmente errado.
Então, as pessoas se fecham e pensam na ideia de que morrer é a única opção para aplacar a dor.
Neste, sentido, você que deseja ajudar alguém, compreenda que seu familiar ou amigo está diferente.
Entender que a pessoa está diferente já é uma grande ajuda!
Não deposite nele conselhos, receitas e falas positivas, pois elas reforçam justamente a sensação de depreciação e automutilação.
Não cobre! Não force! Mas, não abandone!
As possibilidade de ajuda estão neste “entre”, neste hiato entre o “não forçar” e o “não deixar de mão”.
Converse, sem tentar convencer, que os pensamentos e sentimentos que ocorrem podem ser produtos de uma condição mental particular.
Pingue “gotas” de otimismo. Gotas!!
Positividade em excesso é tóxico!
Cuide para que a pessoa não tente o suicídio nos momentos de crise. Retire da casa armas e venenos. Controle o acesso às medicações. Não as deixe amplamente disponíveis.
Há depressões não letárgicas, em que o desespero pode causar uma agitação psicomotora responsável por aplicação de métodos letais.
Uma pessoa em sofrimento, decorrente de ideação ou tentativa de suicídio, não precisa de um juíz!
Juíz é todo aquele que julga. Julga com “lentes” que não cabem no olhar daquele que ele tenta ajudar.
Acolher é testemunhar! Jamais, julgar!
Pare de produzir falas enxertadas de positividade, que excluem o sofrimento da existência e só fazem a pessoa se sentir mais ainda fracassada.
Pare de falar de si mesmo. O foco da atenção é quem sofre e não as suas superações egóicas.
Faça o simples:
Esteja presente com sua presença;
Escute mais e fale menos;
Observe se as medicações estão em dia;
Proponha uma ida ao psicólogo e a um psiquiatra;
Prepare uma comida fresca;
Convide para um passeio curto;
Elogie sutilmente;
Apresente de modo discreto as benfeitorias de vida do outro;
Fale calmamente, sem impôr.
Abrace, esteja por perto sem ser invasivo.
Enfim, o simples pode ser “mais” nestes casos.
O suicídio não é a vontade de morrer.
A pessoa dificilmente quer morrer quando pensa ou tenta suicídio.
A pessoa vive uma dor insuportável. Dor que abala, estraçalha e destrói. O que ela quer é acabar com esta dor inominável.
O suicídio não é uma escolha entre a vida ou a morte. A dor é abrupta e involuntária. A pessoa sente a dor e acredita que aquela dor não tem uma solução.
A dor causa uma espécie de estreitamento cognitivo e simbólico, em que as possibilidades se esvaem. A pessoa não enxerga alternativas e se isola.
Deste modo, converse com a pessoa e mostre-se realmente interessado em escutar seu problema.
Suporte e tolere a pessoa falar da morte.
Com isso, você pode contribuir para que se quebre o paradigma do isolamento.
A pessoa poderá “costurar” outras alternativas para lidar com a dor, que não o suicídio.
É preciso uma implicação coletiva, uma ampliação da “linha do nós”.
Neste sentido, uma análise crítica e reconfiguração dos modos de vida neoliberal também precisam ser feitas.
Vivemos numa cultura narcisista e hedonista. Somos convocados a fugirmos do sofrimento. Cruzamos todos os dias com pessoas que emitem sinais evidentes de sofrimento e seguimos. Não há tempo. Tem-se pressa.
Temos mil seguidores, outros mil nos seguem e não sabemos o nome de nosso vizinho. Melhor é nem ter que suportar sua presença no elevador.
Para quantas pessoas você pergunta, não por educação, mas por uma atenção genuína:
“Como você está?” “Posso ajudar?”
Pois bem. Essas simples perguntas tem uma eficiência grandiosa na diminuição da taxa de suicídio.
Segundo a OMS, 50% das tentativas de suicídio não são notificadas porque são tentativas “leves”, que acabam se resolvendo na própria comunidade.
Exemplo: um indivíduo ingere certo número de comprimidos, é socorrido a tempo, coloca o dedo na garganta e, pronto, algo ali é “resolvido”.
Conclusão: é preciso fortalecer a comunidade para uma intervenção precoce.
Aquelas perguntas – “como você vai?” E “posso te ajudar?” – muda a vida das pessoas porque elas se sentem acolhidas.
As pessoas percebem que não estão sozinhas. Criamos uma rede de apoio artificial que poderá fomentar a crianças de outras redes, mais fortes ainda.
Importar-se com o outro.
Isso pode salvar vidas.
Cuidar com cuidado.
Vale lembrar que cada caso é particular . Generalizações são contraproducentes.
Dra. Kelly Albuquerque
Doutora em Psicologia.
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